Como profissionais de tecnologia nos vemos naturalmente atraídos pelo constante fluxo de mudanças e novidades em nossas vidas modernas. Mas na medida que assumimos responsabilidades de gestão sobre serviços e suas metas de qualidade e custos, sentimos também um certo receio e porque não dizer aversão aos efeitos colaterais de novas versões e novos produtos em nosso organizado escopo de atividades. Principalmente quando tais mudanças geram problemas de difícil análise e resolução.
Por se tratar de sistemas complexos a causa raiz de uma falha não pode ser explicada pela análise em separados dos componentes dos sistemas. A tradicional abordagem científica do reducionismo – que praticamos desde crianças, desmontando o relógio para ver como funcionava - não chega a lugar nenhum com sistemas complexos, porque a função de interesse surge da interação direta dos componentes de um sistema.
Seja a bolsa de ações, o fluxo de dados da Internet ou o comportamento de grupos de aves migratórias, o desempenho do todo é por assim dizer "auto-organizado" e a análise de uma única empresa, ave ou componente de rede não explica o comportamento do todo.
Por outro lado uma interessante característica de sistemas complexos e “auto-organizados” é a adaptação.
As empresas se adaptam ao mercado, o sistema imunológico adapta-se à infeção, os animais se adaptam ao seu suprimento alimentar, e podemos considerar que a capacidade de adaptação é uma das razões pelas quais a evolução parece levar a sistemas ainda mais complexos.
Quanto mais rápido e eficientemente um sistema se adapta mais complexo ele se torna, gerando um esforço ainda maior de organização.
Os sistemas mais bem-sucedidos são aqueles que conseguem encontrar um equilíbrio entre a necessidade de ordem e o imperativo de mudar, o “limiar do caos”
Consideremos o “limiar do caos” como um lugar onde há inovação suficiente para manter um sistema vivo vibrante e suficiente estabilidade para evitar que ele caia em anarquia. É uma zona de conflito e turbulência, onde o velho e o novo estão constantemente buscando seu ponto de equilíbrio.
Muita mudança e o sistema se arrisca a cair em incoerência e dissolução, mas se o sistema se move muito longe do “limiar do caos”, torna-se rígido, congelado, ultrapassado.
Em Junho de 2001 após meses de preparação em um projeto para a migração completa de nossa plataforma de Novell para Microsoft, trocando ao mesmo tempo todos os cerca de 80 servidores de diretório, arquivos, Proxy, Correio e gestão, atualizando os quase 7000 clientes para Windows 2000 e Office 2000, recebemos a noticia de a estrutura global não poderia suportar nossa migração para Exchange 2000 a tempo de cumprir nosso compromisso com as áreas de negocio. A alternativa disponível era implementar o Exchange 5.5 o que trazia profundas alterações no projeto e uma insatisfação dos técnicos ansiosos por implementar a ultima versão disponível com suas melhorias e novidades. Sem mencionar os custos adicionais de uma migração complementar nos próximos meses.
Na mesma viagem onde recebi a triste noticia também entrei em contato com o time que estava testando o Windows XP, na viagem de volta passeio a noite inteira usando a versão beta que me foi disponibilizada. Tive que ir ao banheiro do avião para recarregar no notebook e continuar com minha exploração. Ao chegar ao Brasil já estava convencido que atrasaríamos o projeto para que estrutura mundial pudesse suportar nossa migração para o Exchange 2000 e ao mesmo tempo alteraríamos nosso escopo para migrar nossas estações para o Windows XP ao invés do Windows 2000.
Um movimento ousado que não só compensou os custos de estender a duração do projeto, como forneceu aos nossos usuários uma plataforma mais moderna, estável e completa que o Windows 2000 sem abrir mão da versão mais nova do Exchange.
A capacidade de adaptação do time às mudanças, a flexibilidade de nossa gestão em entender os benefícios e a coragem de inovar nos permitiram estar à frente do mercado e de quebra, e de quebra através de uma parceria com a Microsoft que trabalhava conosco nesse projeto, permitir que pela primeira vez na estória um sistema operacional fosse lançado em português simultaneamente a outras línguas.
O português era considerado TIER 2 e normalmente disponibilizado até 6 meses depois do lançamento de uma nova versão de Windows. Recebemos o MUI em português 30 dias antes do lançamento em Outubro de 2001 e em 15 de dezembro, após cinco intensos finais de semana, entregávamos todo o ambiente migrado para Microsoft e usando o Windows XP. Um grande sucesso para equipe e uma das primeiras migrações em massa da empresa a nível mundial.
A constatação dessa dualidade de ordem / mudança e sua aceitação não fizeram o meu dia mais fácil, mas certamente trouxeram algum conforto para o “gerente / técnico” que vivem em mim… estamos em equilíbrio também.
Autor
Antonio Lima
Profissional de informática a quase 40 anos, acompanhou a evolução dos mainframes para os PCs, para as redes, para a REDE e agora para a CLOUD, quase sempre trabalhando em infraestrutura e gestão de projetos. Um entusiasta confesso que nunca se cansa de aprender e se maravilhar com as infinitas possibilidades da tecnologia e suas aplicações para o beneficio e aprimoramento da espécie humana.